A sociedade afluente do Primeiro Mundo concretizou no pós-guerra a noção da universalidade da condição de cidadania e, também, a possibilidade histórica da constituição da responsabilidade social do Estado para com as necessidades básicas do ser humano - de reprodução social - antes entendidas como de responsabilidade individual. Esse modelo de Estado é conhecido como do bem-estar social.
A exclusão social no final do século XX assume o caráter de um conceito-denúncia da ruptura desse Estado do bem-estar social. Ao mesmo tempo, proclama-se o direito à diferença podendo-se apontar a presença de discriminação quando não se respeita esse direito. Assim, o conceito de exclusão social hoje confronta-se diretamente com a concepção de universalidade dos direitos sociais e da cidadania. A exclusão é a negação da cidadania.
Nos países desenvolvidos, a exclusão caracteriza-se pela perda de um patamar anterior de universalidade da cidadania. No entanto, há um caráter diferencial na concepção de exclusão social, quando territorializada nos países emergentes e quando referente a um segmento social marcado pela pobreza. Essa forma de entender incorpora uma dimensão cultural, pois a exclusão não é a mesma em qualquer cultura ou realidade.
Consideramos que uma distinção entre exclusão social e pobreza. Por conter elementos éticos e culturais, a exclusão social também se refere discriminação e à estigmatização. Pobre é o que não tem, enquanto o excluído pode ser o que tem sexo feminino cor negra, idade avançada opção homossexual. A exclusão alcança então valores culturais e diversas discriminações - o que não significa que o pobre não seja discriminado.
Trazer o tema da exclusão social para o Brasil implica analisá-lo em uma sociedade colonizada, que já partiu do conceito discriminador entre colonizador e colonizado. Soma-se a isso o processo de escravidão, que restringiu a condição humana à elite e fez de negros e índios objetos de demonstração de riqueza. A particularidade da história brasileira mostra, portanto, muitos obstáculos e dificuldades em estender a universalidade da condição humana a todos os brasileiros.
0 Estado brasileiro não afiança a garantia de direitos em suas ações: caracteriza os atendimentos sociais como concessões, partilhadas com a filantropia da sociedade, não os assumindo como responsabilidade pública. A demanda pelos serviços sociais públicos é considerada em nosso país como uma manifestação de miséria ou de incapacidade em obter o desejado acesso a serviços do mercado, dentre os quais os de saúde e educação.
Alargar a concepção de inclusão social no Brasil exige, antes de mais nada, um outro padrão de sociedade, fundada na civilidade ou na ética civilizatória.
É importante ter em mente, como propõe recente relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD & IPEA, 1996), analisando dados sobre recursos humanos, que a lesão ao desenvolvimento humano não é de âmbito pessoal e individual, mas societário. A perda da capacidade humana pela ausência de condições de expandir as potencialidades individuais, quer pela precariedade do viver, quer pela morte precoce, reduz a riqueza potencial e o avanço de uma sociedade.
No que se refere à educação não podemos pensar em eqüidade sem antes considerar a inclusão de todos, no sentido de romper a barreira do acesso das classes populares riqueza social.
A educação que visa a inclusão de todos assume um caráter indenizatório: supõe o reconhecimento e a restituição das perdas ao desenvolvimento humano causadas pela cultura elitista, dominadora, machista, pela subordinação econômica e política a que o neoliberalismo nos submete como países emergentes. Esta a que de nominamos educação indenizatória, que visa restituir a condição maior de ser humano, isto é, a extensão da categoria de humanos a todos.
Acreditamos que a escola tem um papel fundamental nesse processo indenizatório. 0 primeiro passo para isso o da conscientização dos padrões de dignidade. Vimos defendendo que não se avançará na consolidação das garantias sociais enquanto a sociedade civil não encaminhar um projeto solidário nessa direção. A exigência de condições mínimas precisa fazer parte do padrão de dignidade que a sociedade quer ver reconhecido. Sem dúvida o Estado deve consolidar e regular tais garantias. Todavia, sua efetivação decorre de exigência da sociedade. Precisamos construir uma pedagogia da inclusão. Não basta a palavra de ordem: "toda criança na escola".
É preciso ousar, dar um salto de qualidade e comprometer a escola e a sala de aula com o processo mais amplo de inclusão social. preciso rever nossos currículos escolares para incorporar a discussão desse padrão. A escola que não incorporar o contexto histórico e social em que está inserida, que não convidar os alunos a refletir sobre as questões do mundo contemporâneo que fazem parte de seu cotidiano, trazendo para a sala de aula temas como violência, drogas, sexualidade, nem os convidar a traçar relações entre o presente e o passado, compreendendo os processos que ocasionam as mudanças sociais, corre o risco de vir a ser mais um elemento de exclusão social, quando deveria contribuir para a inclusão.
É possível democratizar o ensino e o conhecimento. Há uma enorme satisfação em encontrar uma resposta a uma pergunta que nos inquieta. Esse prazer precisa ser democratizado, todos podem e devem aprender, independente de idade, sexo, raça ou qualquer outro fator distintivo.
Ensinar e Aprender: Reflexão e Criação. Vol. 2
Aldaíza Sposati
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